O então candidato a reeleição, Odair Sivirino, teria cometido abuso politico e econômico envolvendo cestas básicas que seriam destinadas a famílias carentes durante pandemia da Covid-19
A promotora eleitoral Ana Carla Dias Lucas Mascarenhas, da 35ª Zona Eleitoral de Aragarças (GO) pede a condenação do prefeito de Bom Jardim de Goiás, Odair Sivirino Leonel e de seu vice, Manoel Oliveira Souza, ambos do Democratas, por compra de votos e abuso de autoridade econômica e política na campanha para reeleição a prefeitura da cidade goiana no pleito de 2020.
Em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) o Ministério Público Eleitoral (MPE-GO) elenca diversas irregularidades durante a campanha dos então candidatos à reeleição. A promotora solicita condenação de Odair à sanção de inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos oito anos subsequentes à eleição de 2020, bem como à cassação do seu respectivo diploma e também o de seu vice. Também é pedido o pagamento das multas por captação ilícita de votos e conduta vedada.
Entre os casos apontados no AIJE estão a entrega de cestas básicas em veículo oficial de campanha durante o período eleitoral, uso de recursos que deveriam ser destinados para a compra de kits alimentares para as crianças da rede municipal durante a pandemia da Covid-19 para a compra de cestas básicas em troca de apoio eleitoral, repasses financeiros para consertos de veículos e passagens em troca de votos, além da tentativa de instruir uma das pessoas que haviam recebido valores da campanha para mentir em juízo.
Casos
O primeiro caso trata-se do uso de recursos destinados à instituição de longa permanência (ILPI) de Bom Jardim de Goiás, advinda do Governo Federal em razão da pandemia de Covid-19, na compra de cestas básicas no valor de R$ 23,7 mil a serem entregues no Lar dos Idosos São João Batista.
A irregularidade apontada pelo MPE-GO mostra o transporte dos alimentos em carro particular da campanha, durante período eleitoral, adesivado com o número da coligação (25), a pedido da esposa de Odair, Cátia Núbia Silva Reis.
Além desse fato, também conforme um dos responsáveis internos da instituição de longa permanência, Celson Luiz Alves da Silva, os alimentos não foram entregues integralmente.
O veículo particular acionado pela esposa do investigado tratava-se de um caminhão F-4000, naquele dia conduzido pela pessoa de Weberson Matias, companheiro de Débora Leonel dos Santos Silva (prima e servidora pública subordinada à Odair) à época dos fatos. Inclusive, nem Cátia e nem Weberson negaram que o veículo utilizado era particular e estava adesivado com o número da coligação.
Segundo a promotoria “o fato de os alimentos adquiridos pela Administração Municipal, com dinheiro público, serem retirados do estabelecimento comercial em veículo com ostensiva propaganda eleitoral dos candidatos, por si só, já denota irregularidade da propaganda e abuso do poder político, uma vez que, para qualquer eleitor que visualizasse o ocorrido, na pequena cidade de Bom Jardim de Goiás, chegaria a uma única conclusão: que o ODAIR e sua campanha estavam doando grande quantidade de bens ao Lar dos Idosos”, diz no documento.
A defesa alegou que a utilização do veículo particular adesivado teria sido o próprio dono do Supermercado Mineirão, pessoa que deveria proceder a entrega, fato esse negado pelo proprietário Carlos de Souza Carneiro, que afirmou que se dispôs a levar os alimentos unicamente no automóvel de seu estabelecimento, o que foi negado pela esposa de Odair.
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Ainda se tratando de cestas básicas, outra ilegalidade apontada no AIJE foi o uso de recursos que deveriam ser destinados a compra de kits de alimentação para alunos da rede municipal durante a pandemia do Covid-19, serem utilizados como moeda de troca por votos.
Segundo consta, o município deixou de fornecer os kits nos meses de agosto, setembro e outubro de 2020, argumentando que empresa vencedora da licitação teria se negado a fornecer os alimentos sem que houvesse realinhamento de preços, o que foi confirmado pelo próprio proprietário do estabelecimento, quando ouvido.
Entretanto, é sabido que a Administração Municipal dispunha de mecanismos para que os educandos não fossem prejudicados, como, por exemplo, a possibilidade de se promover procedimento de dispensa de licitação, o que realmente foi feito, contudo, três meses depois da negativa do Supermercado ganhador do certame e, estranhamente, dias antes da eleição.
A entrega dos kits foi realizada pessoalmente pelo secretário de Educação, direta e individualmente na casa dos pais de alunos beneficiados, em veículo oficial do Município de Bom Jardim de Goiás. “Nesse aspecto, a distribuição à domicílio, nas vésperas da eleição, ainda que não tenham sido coletadas provas de que houve pedido de voto, ofendeu o princípio da impessoalidade, uma vez que personificou a ação na pessoa do gestor público, candidato à reeleição”, explica a promotora.
Em um dos trechos do vídeo anexado como prova na ação judicial, o próprio secretário, em resposta ao candidato opositor à Odair, que flagrou entrega das cestas e o questionou a respeito da legalidade do ato, disse: “dia 15, temos uma política para ganhar”, reforçando o caráter eleitoreiro da ação articulada.
Verba para conserto de veículos e passagens
Além das cestas básicas, a promotoria também juntou provas, através de áudios anexados ao processo, que comprovam o uso de recursos para favores como conserto de veículos, plotagem de carros e compra de passagens, em troca de apoio eleitoral.
Diversas testemunhas, em depoimentos extrajudicial e judicial, afirmaram terem recebido valores das próprias mãos do prefeito Odair e também de terceiros, a mando do prefeito.
A defesa técnica utilizou-se da estratégia de desacreditar esses testemunhos, alegando serem pessoas de caráter duvidoso. Entretanto, conforme diz a promotora, não há nada que descredibilize o testemunho descrito, uma vez que não há prova de que a depoente tenha sido cabo eleitoral de outros candidatos ou que tenha interesse pessoal na possível (e esperada) procedência da presente ação judicial.
Também há provas anexadas, bem como vídeos, áudios e conversas via aplicativo do WhatsApp comprovando a destinação de recursos para estas testemunhas em troca de apoio eleitoral.
Instrução para mentir em juízo
Na ação judicial, a promotora Ana Carla Dias Lucas Mascarenhas separa um capítulo completo para demonstrar a tentativa de orquestrar uma fraude processual por parte de Odair e sua equipe, ao tentar instruir o jovem de 17 anos, Clayton Nunes, a mentir em juízo.
“Aqui, cabe um tópico exclusivo para agasalhar tamanha aberração perpetrada pelo investigado [Odair], dentre tantas outras já listadas, a fim de se manter no poder” frisa.
Câmeras de segurança da Loja Trial, local de trabalho de Clayton, flagraram momento em que Odair comparece ao estabelecimento, no dia 13/11/20, para entregar-lhe R$ 300,00, que seria utilizado para o conserto de sua motocicleta danificada, a fim de que participasse da carreata do então prefeito, a se realizar no dia seguinte.
Tanto as declarações do adolescente quanto as imagens das câmeras de segurança juntadas ao caderno processual confirmam o momento em que o citado investigado chega em seu veículo no estabelecimento comercial, que Renato Gonçalves Lopes sai do automóvel e que Clayton Nunes Soares entra. Quanto a isso não há divergência. Aliás, Renato Gonçalves Lopes, arrolado pela defesa técnica, e o próprio investigado Odair, confirmam essa dinâmica em juízo.
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Ao tomar conhecimento do fato, o MPE-GO, durante processo extrajudicial, requisitou à Polícia Judiciária Civil averiguasse o caso, e colhesse o depoimento do adolescente. Após o fato, antes que fosse inquirido pelo MPE, Odair convocou o adolescente para uma conversa, oportunidade em que passou a instrui-lo a mentir para o sistema de Justiça “sendo tudo gravado licitamente pelo adolescente, afinal era um dos interlocutores”, reforça a promotora.
“A situação estarrecedora, obtida por gravação ambiental juntada aos autos, não deixa qualquer dúvida que o verdadeiro intuito do candidato era a compra de voto e demonstra indubitavelmente que, além de ter abusado de todos os meios que detinha para lograr a reeleição, também foi capaz de tudo para safar-se de uma possível responsabilização”, diz a ação judicial.
Em juízo, Odair confirmou que a conversa existiu, porém disse que não ofereceu ou entregou qualquer quantia ao adolescente.
Vale mencionar que, durante a instrução, houve requerimento de perícia do áudio capturado, que foi deferida pelo Juízo mesmo sem existir qualquer indício de adulteração do documento. Entretanto, a mesma defesa técnica que pugnou pela perícia, dela desistiu, sob o raso argumento de que não teria encontrado profissional qualificado para atuar como assistente técnico.
Confira a Investigação completa.
Portal O Tempo com informações do site Semana7 e MPE-GO